Eduardo Allgayer Osorio

E o agro perdeu

Por Eduardo Allgayer Osorio
Engenheiro agrônomo, professor titular da UFPel, aposentado
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Repercutiu como mais visto o vídeo em que o vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de São Paulo lamenta a desestruturação do Ministério da Agricultura pela migração de suas funções para outras pastas. Enfaticamente, declarou: "O Ministério da Agricultura acabou. Não tem mais o Abastecimento, a Política Agrícola, o Seguro Agrícola e os investimentos necessários. Desestruturaram a agricultura do País".

Pela reforma ministerial implantada, com a criação de 14 novas pastas para acomodar apaniguados e amealhar aliados, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento perdeu parte do nome, indo a gestão do Abastecimento para o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, acompanhado da Conab, da Ceagesp, da Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural e do Incra.

Sobre essa mudança, declarou o ex-ministro da Agricultura de Lula (2003-2006), o engenheiro agrônomo Roberto Rodrigues: "É uma pena dividir um ministério em três. Para desempenhar suas funções, a Agricultura já depende de integrar-se com o Planejamento, com a Fazenda, com as Relações Exteriores, com o Meio Ambiente e com a Ciência e Tecnologia. Dividido em pedaços, mais difícil se tornará desenvolver políticas coordenadas". A cisão havida tende a gerar divergência entre setores que são complementares, culminando em políticas conflitantes, em fragmentação setorial, insegurança jurídica e em conflitos no campo, tudo o que o agro menos quer.

O Cadastro Ambiental Rural e o Serviço Florestal Brasileiro migraram para o novo Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, sob a liderança de Marina da Silva. Num momento em que o agro brasileiro busca enfaticamente conciliar a produção agrícola com a preservação ambiental, o novo governo coloca os dois temas em pastas separadas, com visões divergentes. É consenso que a produção rural e a proteção ambiental devem andar juntas. Sendo o produtor rural o ator imbuído do duplo papel de produzir bens agrícolas preservando o ambiente, por que tratar desses assuntos em ministérios distintos?

Com frequência o discurso ambientalista desconsidera que o conceito de sustentabilidade repousa num tripé - o econômico, o social e o ambiental -, tratando da proteção ambiental sem levar em conta os demais aspectos evolvidos. Mantida a produção e a proteção ambiental num único ministério, como estava, se reduzem as zonas de sombreamento, otimizando o uso dos recursos humanos e financeiros.

O provável resultado da mudança ministerial feita será a geração de conflitos. Um claro exemplo disso ocorreu na construção da hidroelétrica de Belo Monte, no rio Xingu. Projetada para atender 60 milhões de consumidores, por decisão da então ministra Marina da Silva o projeto inicial, que teria um reservatório de água, foi alterado para usar apenas a vazão do rio ("a fio d'água", como é referido) sob o pretexto da preservação ambiental. O resultado foi que nos períodos de baixa precipitação, comum entre maio e setembro, das 18 turbinas construídas com um gasto de R$ 40 bilhões, apenas uma recebe água em quantidade suficiente para ser ativada. Para evitar um iminente "apagão energético" torna-se necessário ativar as termelétricas que, afora queimar uma fonte de energia poluidora, encarece a tarifa. Perderam ambos, a ambiente e a população.

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